8.10.09

Sobre a Qualidade do Ensino

Calcula-se que só uns 20 por cento dos alunos que freqüentam hoje o segundo grau nas Escolas Públicas conseguiria entender as matérias ensinadas lá: Física, Química Orgânica, Biologia, Trigonometria, Literatura, etc. Estou mentindo? Esse teste já é feito, o ENEM está aí para provar. Grande parcela dos alunos do segundo grau são analfabetos funcionais. A solução? Acham que são matérias dispensáveis, o aluno não precisa disso para viver. Querem que passem a estudar “Filosofia”.

O desabafo comum diante dessa situação é o seguinte: como o ensino no Brasil piorou! A gente chega a ver de vez em quando pessoas com mais de cinqüenta anos dizerem: um curso ginasial do meu tempo valia por um curso superior dos de hoje. Será?

Talvez sim e talvez não, pois também se verifica este outro fato: os bons alunos de hoje sabem muito mais que os bons alunos de quarenta anos atrás. Isso também é fácil de provar. Pessoalmente, tenho exemplos claros de jovens próximos a mim. Eles são a elite intelectual, que verdadeiramente tem acesso ao ensino, independentemente de qualquer legislação.

Seríamos mais fieis à verdade então se o desabafo fosse outro: como os alunos no Brasil pioraram!

Então, será que nossa população mudou?
Não, não mudou. O problema veio com a universalização do Ensino. Antigamente só estudava quem queria, ou tinha vocação. Hoje a educação é compulsória. Todos os jovens são colocados na escola, e OBRIGADOS a ficar lá, queiram estudar ou não. Consigam estudar ou não. Os “maus alunos”, os “malandros” etc. – estão todos colocados na mesma escola junto com os bons alunos, na mesma turma. Eles não querem estudar, mas estão lá, junto com os que querem. Acho até que existe lei proibindo separar.

Peço a você, leitor, que pelo menos por enquanto deixe de lado as verdades oficiais, e adote um espírito independente e crítico. É preciso reconhecer primeiro o
Mito do Treinamento. Esse mito é um subproduto do pensamento politicamente correto – falarei dele depois. Para o nosso objetivo aqui basta reconhecer provisoriamente este fato óbvio: nem todo conhecimento é acessível a todos. A Teoria da Relatividade, a Física Quântica, o Estruturalismo de Saussure, até mesmo a compreensão global da Filosofia ou da Literatura – isso é para poucos. Do mesmo modo que a corrida de 100 metros rasos ou o malabarismo. Pessoas têm aptidões naturais. No mundo inteiro é assim. É preciso respeitar a Natureza, incluindo aí a nossa própria.

A pretendida universalização do ensino, que creio não ser só do básico, e que pretende transformar toda a população em gente “com diploma” esbarra em dois problemas capitais: o da qualidade dos professores e o da qualidade dos alunos. Eu gostaria que aquele mesmo teste do ENEM que é aplicado nos alunos fosse aplicado também nos professores. O mesmo teste, com as mesmas questões. A gente teria uma idéia melhor dessa situação.

São coisas de que todo mundo sabe, mas não fazem parte da verdade oficial. É preciso parar de colecionar números para mostrar aos burocratas da Unesco, parar de olhar para índices em um papel, e olhar para as crianças! O idolatrado “número de horas em sala de aula” é por si só um item destituído de sentido, pois vai depender do que estiverem fazendo na sala de aula. Eu gostaria muito que o órgão que melhor faz investigações no Brasil – a Imprensa – fizesse um longo trabalho investigativo, talvez matriculando um jovem jornalista numa escola pública da periferia de uma grande cidade, preferencialmente próxima a uma favela, e relatando o que acontece lá durante um semestre inteiro.

Mas voltemos ao problema que é o foco desse artigo, o da QUALIDADE DOS ALUNOS. O melhor professor do mundo nada pode fazer diante dos vândalos que freqüentam nossas salas de aula. O vândalo contamina aqueles que estão próximos dele. Quem já deu aula, sabe. E é impossível um professor não se adaptar aos seus alunos.

Como resultado desse quadro o ensino vai se adaptando à realidade, e às novas tecnologias. Primeiro, transformando as provas em “trabalhos” para serem copiados da Internet – coisa de que eles gostam. Por favor, não finjam que não sabem disso, ou não venham me citar exceções. Segundo, “amaciando” o conteúdo, substituindo-o por um que permite dúbias interpretações. E finalmente, não exigindo a realização de provas para passar de ano. Ou então compondo essas provas com questões sobre assuntos da vida cotidiana dos alunos. Tenho medo de dar exemplos.

A maior vítima dessa situação são os bons alunos, que existem aos milhões, e sempre existiram, e que são prejudicados, pois têm que acompanhar o nível dos idiotas que sentam na carteira ao lado.

Eis nosso dilema: admito a necessidade da escola cidadã ou “inclusiva” na formação de crianças das classes desfavorecidas. Acredito que suas lições de socialização, sua merenda escolar, são fatores importante na aceleração do desenvolvimento do nosso povo. A longo prazo, isto terá valor imenso, vamos aumentar a qualidade da população.

Mas não podemos ir contra os fatos que exigem medidas mais urgentes. Existe realmente a degradação geral do ensino público, e está ficando cada vez pior. Some-se isso a massificação cultural selvagem promovida pela concorrência entre os grandes meios de comunicação e chegamos aos livros didáticos com palavrões e figuras obscenas – por enquanto só começaram a aparecer, mas é uma questão de tempo para que se tornem os mais utilizados. E ainda há muito espaço para piorar.

O que podemos fazer para reverter essa situação?

Fato: o problema da educação nos países em desenvolvimento não se resolve da noite para o dia. O problema é reconhecidamente difícil, é desafiador, é talvez o maior de todos os nossos problemas.

Isso não nos impede de pensar em algumas possibilidades. Reconheçamos primeiro que cada povo é um povo, e nem tudo compensa copiar dos países mais desenvolvidos. Há coisas que temos que desenvolver sozinhos, porque ninguém vai fazer para nós – como a soja adaptada ao cerrado. E só para dar um exemplo falarei aqui de uma idéia óbvia, que esbarra em conceitos políticos já petrificados, mas devemos pensar também que tudo tem limite. Talvez essa idéia possa suscitar outras mais inteligentes: isolar o ensino mau do ensino bom.

Atualmente pais que podem pagar já fazem isto, ou pelo menos tentam fazer, colocando seus filhos em escolas particulares (não estou dizendo que não existam más escolas particulares). Sei de pais que deixam de pagar outras necessidades básicas para separar seus filhos dos meliantes que freqüentam a mesma escola pública.

Os pais mais pobres não deveriam também ter o
direito de isolar seus filhos desses meliantes? Eu sinto que estamos faltando com o nosso dever ao não permitir que crianças de boa índole não recebam a educação que merecem, e ainda sejam torturadas pelo tal do bullying. Será que isto tem a ver com os Direitos Humanos? E os Direitos Humanos dosmeliantes, que em nosso pais é o prioritário: será que podem ser obrigados a estudar, contra a vontade?

Façamos a hipóteses – só a hipótese – de que os alunos das escolas públicas fossem separados segundo sua capacidade de aprendizado. Nessa hipótese "absurda e cruel, que não passaria pela cabeça de ninguém com um mínimo de humanidade", desconfio que teríamos resolvido instantaneamente, como num passe de mágica, o problema da qualidade do ensino para os “bons” alunos.

Uma criança com boa índole, inteligente e saudável, que atualmente quem não pode pagar vê atirada às feras, é um ser maravilhoso. Desperta amor de todos os lados. Suspeito que até seus professores também se transformariam, instantaneamente, pelo efeito do mesmo passe de mágica, em “bons professores” – pois eles também melhorariam, se fossem motivados. Nem é questão de salário: o mundo está cheio de gente idealista querendo ensinar a esses bons alunos.

E os outros alunos, supostamente segregados, continuariam onde sempre estiveram, pois não vão aprender nada mesmo, nem que “estudem” até os 60 anos. Quero assegurar aqui que sou um firme defensor dos Direitos Humanos, e não vejo nenhuma crueldade em respeitar a natureza de um aluno. Cruel talvez fosse o contrário: obrigá-lo a agir contra a sua natureza.

Deveria haver um limite entre o politicamente correto e a demagogia. Conheço um adolescente com problemas psicológicos, incapacidade de atenção diagnosticada por vários psicólogos, e que mesmo sem ter capacidade, passa de ano porque decidem que seria pior “para ele” repetir. Para o resto da classe, não. É a mãe que faz todos os seus trabalhos escolares. Não sabe fazer as “quatro operações”, mas uma das suas matérias é “Filosofia”. Desconfio que nunca irá além dos pré-socráticos. Quem está enganando quem?

O Estado não é tão incompetente na Educação como dizem. Nossas Universidades públicas ainda são as melhores, e sabem porquê? Porque só é permitida a entrada mediante seleção – seleção sem provas oferecidas aos jornais no dia anterior – e portanto lá existem bons alunos. Mas isso vai durar bem pouco, porque nossos políticos estão trabalhando arduamente para reverter essa situação. Estamos simplesmente na contramão da solução, contaminando o nosso bom ensino superior com a mesma praga do ensino fundamental.

Isolar o ensino bom dos maus alunos. Isso é condição
sine qua non. E em vez de transformar toda a escola em parque de diversões, deixaríamos esse setor apenas para os alunos que não demonstrarem capacidade de aprendizado. Videogames, Orkut, MSN Messenger, educação sexual, existe muita coisa capaz de prender a atenção de um garoto desses. Sem contar os esportes, que sempre fazem bem. E ainda com uma bolsa-escola que dá uns trocados para os pais e rende muitos votos. Nem perderíamos os pontinhos do IDH pelo percentual de alunos na "escola", enfim, continuaria sendo um excelente negócio para todos. Mas deixem o verdadeiro ensino fora da política!

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