13.12.10

Peste, fome, tecnologia: a morte negra

por Juliana Tavares

Em outubro de 1347, uma passageira clandestina chegou ao porto de Messina, na Sicília, Itália, escondida nos navios de uma frota genovesa vinda da Criméia (onde hoje fica a Ucrânia). Seu nome era Pasteurella pestis, uma bactéria que matava em pouco tempo e que se espalhou rapidamente. A doença que ela provocava logo levou a uma pandemia e recebeu o nome de Peste Negra. A conseqüência de sua entrada na Europa foi simplesmente devastadora: a morte de cerca de 34 milhões de pessoas, ou seja, um terço da população do continente.

Naquele verão, em Florença, cadáveres empilhavam-se nas portas das casas e nas ruas e o cenário de desespero não demorou a se espalhar pelo resto da Itália, França, Portugal, Espanha, Inglaterra, Egito, Síria, Palestina, Alemanha e por último a Rússia, por volta de 1351. Nas axilas e virilhas dos contaminados, surgiam protuberâncias (os bubos) do tamanho de um punho, seguidas do aparecimento de manchas negras pela pele. Dos corpos saía um odor repugnante, e nenhum dos tratamentos populares da época, como a sangria e as poções de ervas, tinha utilidade. A morte chegava entre quatro e sete dias após o início dos sintomas e atingia suas vítimas por meio das pulgas dos roedores – havia muitos insetos e ratos nas casas de camponeses e castelos, com poucas condições de higiene (na época, lavar com sabão ainda era um hábito caro). A população, contudo, acreditava que a doença transmitia-se pela respiração e, para afastar o “ar ruim”, os médicos recomendavam que se queimasse madeira perfumada com almíscar ou louro e que o chão fosse borrifado com vinagre e água de rosas. “Não havia ninguém para enterrar os mortos, fosse por dinheiro ou amizade”, disse o italiano Adnolo di Tura em um texto que escreveu sobre a doença em 1348 depois de enterrar os cinco filhos, vítimas do mal. As origens do surto de peste no século 14 são controversas. A teoria mais aceita cita as estepes na Ásia central e no norte da Índia como os pontos focais. Dali, o mal se espalhou até a China e, mais tarde, para toda a Europa. Ratos e pulgas infectados nos navios, com comerciantes e exércitos mongóis que transitavam pela Rota da Seda, levaram a peste para os portos europeus.

A fome como inimigo

Quando não era a peste, a fome fazia milhares de vítimas na Idade Média. Entre 1315 e 1317, a Europateve a pior produção de alimentos de sua história. Os campos sofreram diversos alagamentos e as plantações não estavam suficientemente maduras quando colhidas, dificultando a estocagem. Como se não bastasse a má qualidade da comida disponível, no início de 1316 o inverno rigoroso dizimou as colheitas. Os preços do trigo triplicaram e o pão passou a ser misturado a excrementos de pombos e de porcos, cascas de árvores, palhas e caules de ervilha. Não havia o que comer nem para a minoria da população que possuía dinheiro. Em algumas regiões, cerca de 70% dos rebanhos morreram de doenças causadas pela desnutrição e, mesmo assim, foram comidos, levando à disseminação de pestes. A fomelevou ao canibalismo – registrado desde o interior da Inglaterra até a Livônia (atual Estônia). Entre 1594 e 1597, uma sucessão de quatro safras ruins trouxe mais desespero e morte. Cerca de 10% da população francesa morreu faminta. O problema afetaria a Europa até o início do século 18.

Templo do saber

Com a fundação das primeiras escolas por Carlos Magno no século 7, a cultura greco-romana, até então guardada nos mosteiros, voltou a ser divulgada. Apenas no século 11, porém, é que a primeira universidade para o estudo do direito, da medicina e da teologia surgiu em Salerno, na Itália, com base nas escolas episcopais. Organizadas pela Igreja, contavam com professores de duas ordens religiosas: os dominicanos (dedicados mais à ciência e ao pensamento aristotélico) e os franciscanos (cuja influência era fundamentada nos ensinamentos de santo Agostinho). A partir dessas universidades é que se desenvolveu a escolástica: uma linha dentro da filosofia medieval que procurou conciliar os ensinamentos da doutrina cristã com o platonismo e o aristotelismo.

Acertando os ponteiros

O primeiro relógio mecânico foi construído em 850 por Pacífico, arcebispo de Verona. Consistia em um conjunto de engrenagens movido por pesos. Até o fim do século 13, porém, o dispositivo só foi utilizado em igrejas ou em pequenas torres públicas. O mais antigo deles instalado é de 1309, na Igreja de Santo Eustórgio, em Milão, Itália. Em 1410, o arquiteto florentino Fillipo Brunelleschi construiu relógios que usavam uma mola em espiral. Serviram de modelo para que o serralheiro alemão Peter Henlein aperfeiçoasse o invento em 1510, o que possibilitou o surgimento dos primeiros relógios mecânicos portáteis, fabricados na Inglaterra, França e Suíça.

O multiplicador de livros

Johannes Gutenberg inventou a prensa de metais móveis, em 1438, na cidade de Estrasburgo (hoje na França), e revolucionou a tipografia mundial. Embora a tecnologia já fosse conhecida na China desde o século 11, os tipos móveis chineses não suportavam um longo uso e mal retinham a tinta da impressão. O trabalho de Gutenberg foi aperfeiçoar os blocos de impressão já existentes na Europa e desenvolver novos modelos de caracteres feitos de metal. Também criou uma tinta de impressão à base de óleo e prensas feitas das peças utilizadas para espremer as uvas na fabricação de vinho. O processo logo se espalhou por todo continente, em 50 anos, as obras existentes, que não passavam de centenas, se transformaram em milhares.

A força da água

A primeira vez em que a água foi utilizada como força motriz aconteceu num moinho de grãos horizontal, criado no Egito por volta de 100 a.C. Anos depois, com a invenção das primeiras engrenagens, optou-se pelos moinhos verticais, que chegaram à Europa gradativamente. A primeira evidência em grande escala dessas engenhocas vem da Inglaterra, em 1086, quando foram registrados 5 624 moinhos de água no país. Naquele ano, os moinhos foram pela primeira vez usados para a fiação de tecidos. Isso transformou a indústria de lã inglesa, aumentando sua produção. Eles também foram aproveitados para o escurecimento do couro e, em 1238, para a fabricação de papel. Os moinhos também forjaram o ferro, ajudaram a serrar madeira e a fazer malte para a cerveja. Por causa da importância na economia e da redução no tempo de serviço dos trabalhadores, os moinhos de água produziram uma espécie de “revolução industrial” na Europa a partir do século 11.

Os dois sábios medievais

A Idade Média teve dois grandes filósofos: são Tomás de Aquino e Roger Bacon. Frade dominicano, são Tomás nasceu em 1227, na Itália, e foi responsável pela introdução das obras de Aristóteles na Igreja. “Para Tomás, o ser humano possui uma alma única, unida ao corpo intrinsecamente”, diz Carlos Arthur do Nascimento, professor de filosofia da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Sua obra mais importante é a Suma Teológica, em que revê a teologia cristã sob o princípio aristotélico de que cabe à razão classificar o mundo para entendê-lo. Já Roger Bacon foi um padre franciscano, nascido na Inglaterra em 1214, que ficou conhecido como Doctor Mirabilis por ser o precursor do espírito científico no pensamento moderno. “Estudioso da óptica, a principal importância de Bacon para a filosofia está em sua defesa da matemática para a fundamentação da ciência natural”, afirma o professor da PUC/SP.

Fonte: Aventuras na História