12.1.11

Biografia de Maria Antonieta

Introdução sobre Maria Antonieta


Maria Antonieta
Última rainha da França, ela é uma das figuras mais polêmicas da História. Durante mais de dois séculos, desde que foi executada em 1793 na guilhotina durante a Revolução Francesa, Maria Antonieta foi predominantemente retratada como uma monarca fútil, despreparada para reinar, pivô de escândalos, promotora de festas orgiásticas, manipuladora de um rei fraco - seu marido Luis 16 - e símbolo do que de pior havia na monarquia francesa. Insensível à crise econômica que assolava o país, ela só teria piorado a situação com suas gastanças e ostentações que provocaram a ira popular. Maria Antonieta era uma vilã.

Gravura em livro de 1862 retrata Maria Antonieta e o rei Luis 16, ambos à direita, conversando com o Marquês de La Fayette
© iStockphoto.com /ConstanceMcGuire
Gravura em livro de 1862 retrata Maria Antonieta e o rei Luis 16, ambos à direita, conversando com o Marquês de La Fayette
Mas essa visão da jovem austríaca que, por motivações políticas, se casou aos 14 anos com o futuro regente francês começou a mudar no começo do século 21 a partir principalmente do trabalho de duas historiadoras. O da francesa Evelyne Lever resultou na biografia "Maria Antonieta - A última rainha da França" e o da inglesa Antonia Fraser na obra "Maria Antonieta", cujo texto foi transformado em roteiro do filme homônimo dirigido por Sofia Coppola. Dessas biografias emergiu uma nova visão da jovem rainha, que angustiada pelo tédio, solidão e hipocrisia tornou-se uma mulher inquieta, lançadora de modas, provocativa e uma espécie de protótipo do que são algumas celebridades contemporâneas como Madonna e Lady Gaga.

Essas biografias ajudam a entender melhor o que foi a vida dessa polêmica rainha, cujo casamento com o rei da França, o gorducho Luis 16, levou sete anos para se "consumar", possivelmente em função do desconforto que o monarca sentia com o próprio corpo obeso e da opção pela abstinência sexual feita por ambos. Além disso, o excesso de tempo livre e os exageros da vida na corte em Paris e Versalhes contribuíram para hábitos que ajudaram a construir a péssima imagem que Maria Antonieta carregou por séculos. A sua má fama deve-se também à eficaz propaganda dos revolucionários que derrubaram a monarquia durante a Revolução Francesa e viram na rainha o símbolo perfeito para mostrar a degradação que o antigo regime representava.

A fama que carregou de ninfomaníaca também tampouco corresponde ao que foi sua vida amorosa. A incompatibilidade entre ela e o rei não resultou numa coleção de amantes e traições, como foi popularizado em muitas versões sobre sua vida. Um relato feito pelo Príncipe de Ligne mostra que Maria Antonieta tinha “a qualidade encantadora da obtusidade que mantinha à distância todos os amantes”. Além disso, ela se encantava pelos galanteios e flertes com homens bem mais velhos, que normalmente sabiam dançar e cantar - dotes que faltavam a Luis 16 - e que geralmente animavam suas festas e eram companhias divertidas para ela.

No entanto, a admiração e a proximidade que tinha com esses nobres foi mal interpretada e os encorajou a cortejá-la crentes de que a rainha nutria por eles algo mais do que amizade. Quando se declaravam, Maria Antonieta os rejeitava prontamente. Mas isso não impediu que surgissem várias narrativas que a difamassem e criassem uma imagem de promiscuidade sexual que não corresponde aos fatos históricos. Na próxima página, conheça como foi a vida dessa jovem rainha que escandalizou a França e a Europa do século 18.

Maria Antonieta: uma rainha jovem e alienada

Marie-Antoinette-Josèphe-Jeanne d’Autriche-Lorraine nasceu em 2 de novembro de 1755, em Viena, na Áustria. Ela foi a décima primeira filha de Maria Teresa de Habsburgo e de Francisco Estêvão de Lorena, imperatriz e imperador do Sacro Império Romano-Germânico e fundadores da dinastia dos Habsburgo-Lorena.

Gravura em livro de 1862 retrata Maria Antonieta e o rei Luis 16, ambos à direita, conversando com o Marquês de La Fayette
Reprodução
Cartaz de "Maria Antonieta", filme de Sofia Coppola, baseado em biografia escrita por Antonia Fraser
Ela não teve muito tempo de aproveitar sua infância já que aos 14 anos chegou a França como a prometida futura esposa do neto do rei francês Luis 15. Maria Antonieta era ainda uma menina magra, de pele muito clara e com poucos atrativos, se bem que já mostrava alguns dos atributos de beleza que a fariam ser tão desejada na corte. Luis, o neto do rei, era um ano mais velho do que ela e cheio de qualidades nada inspiradoras, como sua timidez, seu jeito desajeitado e os primeiros sinais da obesidade que o tornariam uma figura caricata. O casamento deles foi planejado para selar a união entre França e Áustria, mais especificamente entre duas dinastias: a francesa dos Bourbon e a austríaca dos Habsburgo.

Maria Antonieta e Luis casaram-se em 1770 e quatro anos depois ascenderam ao trono francês. Apesar de casados, a falta de interesse sexual de ambos durou até 1777, quando ela engravidou do primeiro dos quatro filhos (dois meninos e duas meninas) que o casal teria. Essa demora de sete anos para a "consumação" do casamento, que é atribuída a questões como a vergonha que Luis 16 tinha do próprio corpo ou a uma preguiça sexual de ambos, foi determinante para os boatos que criaram uma imagem perversa de Maria Antonieta. Rumores de casos extraconjugais, de festas orgiásticas, de lesbianismo e outros tornaram-se populares, muitos deles criados e alimentados por rivais políticos. Alguns panfletos de teor pornográfico que circularam na época retratavam a jovem rainha como uma ninfomaníaca.

Para a historiadora francesa Evelyne Lever, Maria Antonieta era imatura, impetuosa e não estava preparada para o papel de uma rainha. Além disso, as festas e recepções encenadas deram-lhe a falsa impressão de aprovação popular, quando na verdade ela estava se distanciando dos reais problemas econômicos e sociais franceses e isolando-se num mundo fantasioso, cercada por um grupo de cortesãos extravagantes, e no qual buscava apenas se divertir. As pressões e chantagens emocionais que sua mãe, a imperatriz austríaca Maria Tereza, fazia sobre ela, mesmo à distância, também contribuíram para prejudicar seus atos numa corte cheia de intrigas e distante do mundo novo criado pela ideias iluministas.

O mais evidente sinal da vida fantasiosa que Maria Antonieta levou em boa parte do tempo como rainha foram suas encenações de peças teatrais em que assumia personagens que a levavam a viver uma outra vida. Ainda assim, nos momentos mais críticos do reinado de seu marido, foi ela quem mostrou-se corajosa, de personalidade forte e leal, como veremos na próxima página.

Lady Gaga do século 18

Uma das facetas mais impressionantes de Maria Antonieta foi sua atitude inquietante em relação à moda de sua época. Ela alterava frequentemente seu visual, que podia incluir desde vestidos luxuosos e penteados com cerca de um metro de altura até peças que compunham uma silhueta andrógina, usadas por ela em seus passeios a cavalo. Isso a tornava popular na mesma medida em que gerava antipatias das damas da corte francesa. Elas temiam que a aproximação que Maria Antonieta fazia muitas vezes de seus trajes com o dos camponeses e a população em geral derrubasse a moda como um dos símbolos da separação entre as classes sociais. Além de inovar nas roupas e penteados, Maria Antonieta também agia como uma estrela pop dos dias atuais, com aparições estratégicas e plantando informações que provocavam calorosos debates públicos. Essas atitudes "midiáticas" muitas vezes colocaram em discussão o papel da mulher na sociedade e da sexualidade feminina. Provocativa, Maria Antonieta foi uma espécie de Madonna ou Lady Gaga do século 18.

Maria Antonieta: provocações e a morte na guilhotina

Com o passar dos anos, as extravagâncias de Maria Antonieta e os boatos criados pelos inimigos políticos de Luis 16 e do regime criaram uma imagem antipática da rainha junto à população. Ela passou a ser denominada pejorativamente como "a austríaca" ou "Madame Déficit" - este último em alusão a sua gastança que teria contribuído para a ruína econômica do país, o que não é verdade, já que o principal motivo da crise econômica francesa no fim do século 18 era a inaptidão do rei e seus ministros em conduzir a economia nacional. A vilanificação de Maria Antonieta, no entanto, era de interesse dos inimigos do regime e até mesmo um suposto caso dela com um cardeal foi inventado para aumentar a antipatia popular pela monarca.

Vila próxima a Versalhes construída para a rainha Maria Antonieta encenar seus papéis teatrais como camponesa
© iStockphoto.com /Alice_yeo
Vila próxima a Versalhes construída para a rainha Maria Antonieta, que ali levava uma vida fictícia como camponesa

Os seguidos escândalos desacreditaram o já frágil governo de Luis 16 e até mesmo a nobreza e a burguesia começaram a opor-se a ele vigorosamente, exigindo reformas financeiras. Foi durante essas crises que Maria Antonieta mostrou ser bem mais corajosa e decidida do que o rei. Nos meses que se seguiram ao início da Revolução Francesa, foi ela quem resistiu à restrição das prerrogativas reais exigidas pelos revolucionários. Ela também negociou secretamente com os membros mais proeminentes da Assembléia Nacional a restauração dos poderes da monarquia. No entanto, seus apelos para que o irmão, o imperador austríaco Leopoldo 2.°, do Sacro Império Romano-Germânico, conduzisse um movimento contrarrevolucionário e a guerra entre a França e a Áustria a partir de 1792 minaram suas pretensões e aumentaram a fúria popular contra ela, que foi considerada uma traidora.

Essas intervenções políticas de Maria Antonieta foram, no entanto, esporádicas já que suas preocupações principais voltavam-se para seus divertimentos. A reclusão da vida na corte e uma mistura de alienação, ingenuidade e teimosia, tanto dela como do rei, contribuíram decisivamente para eles não perceberem que a vontade dos súditos, influenciados pelas ideias do Iluminismo, era a de não aceitar mais o argumento do poder e direito divino dos reis. Os episódios em que Maria Antonieta envolveu-se politicamente defendendo a todo custo a monarquia serviram para aumentar o ódio popular contra ela, que passou a ser o melhor símbolo que os revolucionários puderam usar para mostrar a degradação que o regime monárquico representava.

Em 10 de agosto de 1792, pouco mais de um ano após uma fracassada tentativa de fuga de Maria Antonieta e Luis 16 para fora da França, uma insurreição popular derrubou a monarquia francesa. Luis 16 foi executado na guilhotina por ordem da Convenção Nacional em janeiro de 1793. Quando foi levada a julgamento, após passar mais de um ano na prisão, em 14 de outubro de 1793, Maria Antonieta não lembrava em nada a rainha exuberante e provocativa que havia sido. Ela estava extremamente magra, pálida e com a aparência de uma sexagenária, apesar de ter somente 38 anos de idade. Seu julgamento durou dois dias e as testemunhas narraram orgias comandadas pela rainha, uma suposta relação incestuosa com o filho e um caso homossexual dela com a condessa de Polignac, entre outras histórias. Considerada culpada em todas as acusações, ela foi levada a Praça da Concórdia, em Paris, em 16 de outubro de 1793, onde um público exultante a viu ser executada na guilhotina. Para este evento final, ela vestiu-se intencionalmente de branco para simbolizar sua lealdade à monarquia.

Casos e brioches

As pesquisas feitas pelas historiadoras Antonia Fraser e Evelyne Lever mostraram que muitos dos escândalos e absurdos atribuídos a Maria Antonieta não passaram de propaganda revolucionária e distorções de fatos bem menos escandalosos. Um deles é a atribuição a ela da famosa e debochada frase "Que comam brioches", que a rainha teria dito ao ser acossada por uma multidão faminta que protestava contra a falta de alimentos e a má qualidade do pão. No entanto, essa mesma frase já havia sido atribuída a outras monarcas e nobres europeias antes mesmo de Maria Antonieta ter nascido. Seus casos extraconjugais e as acusações de lesbianismo e incesto também mostraram-se mais folclóricos do que reais. A única situação que pode ter se aproximado de um "caso" foi o relacionamento que ela teria mantido com o conde sueco Fersen. Ainda assim, ele foi tão discreto para os padrões da corte francesa da época que é difícil afirmar se ele culminou em um envolvimento sexual. Assim, as cenas de amor entre a rainha e o conde sueco, que são mostradas no filme "Maria Antonieta" (2006), de Sofia Coppola, não teriam chegado a acontecer de fato, segundo a historiadora francesa Simone Bertière, autora do livro "Maria Antonieta, a insubmissa".

Fontes:
BRITANNICA ENCYCLOPEDIA ONLINE
FRASER, Antonia. Maria Antonieta. Rio de Janeiro: Editora Record, 2006.
LEVER, Evelyne. Maria Antonieta - A última rainha da França. Rio de Janeiro: Editora Objetiva, 2004.