13.2.11

Teorias em queda Descobertas da arqueologia mudam antigas certezas

Peças indicam que civilizações avançadas viveram na Amazônia. Foto:

Antônio Milena/AE
A história da Amazônia não ocorreu exatamente como nos contaram, revelam as modernas conclusões da arqueologia. Sabe-se, por exemplo, que às margens do Rio Amazonas viveram sociedades grandiosas e complexas até o século 16, quando chegaram os colonizadores. Não é possível quantificar com exatidão essas populações, mas estima-se que na Amazônia viviam entre 5 milhões e 5,5 milhões de pessoas, afirma o arqueólogo Eduardo Góis Neves, do Museu de Arqueologia da Universidade de São Paulo (USP). Havia aldeias com mais de 10 mil pessoas no Rio Amazonas, confirma o antropólogo Beto Ricardo, do Instituto Sócio-Ambiental (ISA). “Tinha mais gente na Amazônia no século 16 do que no começo do século 20”, observa Neves.

Embora alguns agrupamentos vivessem de caça e coleta, a maior parte dessa população amazônica era sedentária e dependia de uma agricultura com plantas domesticadas e semidomesticadas. Essa comprovação suscita dois novos fenômenos. Primeiro, derruba a idéia de que os índios da Amazônia eram, em sua maioria, meros caçadores-coletores e viviam mudando de sítio. Segundo, desconstrói a tese de que a derrubada de mata para a prática continuada de agricultura inutiliza a terra amazônica, que é pouco fértil. Deu-se o contrário, sinaliza Neves: a prática de uma agricultura ampla propiciou o depósito de matéria orgânica em largas faixas que os arqueólogos chamam de “terras pretas” – as únicas franjas férteis existentes hoje na Amazônia.

Há evidências de que, até a chegada dos colonizadores, os indígenas da Amazônia mantinham intensa troca de informações com populações do altiplano andino, relata Neves. Uma delas é surpreendente: ancestrais dos incas gravaram inscrições reproduzindo as imagens da mandioca e do jacaré-açu – e no altiplano não havia nem mandioca nem jacaré-açu. Surgem sinais de que as antigas teorias sobre a Amazônia, formuladas pela arqueóloga americana Betty Meggers, podem ter sido parcialmente equivocadas.

Meggers pregou que a Amazônia, por causa do seu meio ambiente frágil, nunca teria acolhido grandes populações, o que agora se comprova falso; ela também rotulou as sociedades amazônicas como periféricas, originadas de povos desgarrados do altiplano andino, onde teriam habitado as sociedades mais evoluídas. Para Neves, há indícios de que a mobilização pode ter ocorrido exatamente ao contrário.

Revela-se que as antigas populações amazônicas não eram tão toscas quanto as que sobreviveram à colonização. Neves exibe uma ponta de flecha de sílex coletada no sítio Dona Stella, em Iranduba, perto de Manaus, datada de 7000 a.C. A mandioca foi domesticada em 5000 a.C., no Alto Rio Madeira, por ancestrais dos tupis – uma época em que o antigo Império Egípcio ainda não estava organizado. No Alto Guaporé (entre Mato Grosso e Rondônia), há sítios que atestam presença humana em 12000 a.C. Cerâmicas encontradas em Santarém têm datações de 5000 a.C. (a mais antiga peça pré-incaica, localizada na Colômbia, é de 4000 a.C.).

Em Iauaretê, no extremo Noroeste do Brasil, Neves contou a índios tarianos que buscava sítios antigos. Eles o levaram a um lugar que teria sido o berço de seus ancestrais, segundo narrava a lenda tariana. Neves escavou lá e encontrou peças preciosas. A datação revelou que aquele povo vivera ali em 1415, quase 80 anos antes da chegada de Colombo às Américas.

Os conquistadores portugueses dizimaram as elites dessas populações extraordinárias. Os que conseguiram escapar fugiram para as cabeceiras dos rios, deixando para trás os melhores fundamentos de sua cultura.

Fonte:ESTADO.COM.BR -