6.4.11

Como explicar os conflitos no norte da África e no Oriente Médio

Levantes populares na Tunísia, no Egito, na Líbia e no Iêmen tomaram conta do noticiário internacional. Saiba como trabalhar esses fatos, que estão marcando a história mundial.

Conflitos no Egito
Conflitos no Egito fizeram a região ganhar
destaque. Depois de 18 dias de protestos,
o general Hosni Mubarak (no poder há 30
anos) deixou o cargo em 11 de fevereiro.
Tudo começou em dezembro de 2010, na Tunísia, quando um jovem ateou fogo ao próprio corpo após a polícia fechar sua fonte de renda, uma banca de frutas e verduras. O caso, potencializado por denúncias de corrupção do governo, deflagrou uma onda de levantes populares contra o desemprego, a pobreza e a inflação galopante. Em 14 de janeiro, o presidente Zine Al-Abidine Ben Ali (no poder desde 1987) deixou o país.

Com o sucesso do evento, outras manifestações eclodiram em terras do norte da África e do Oriente Médio. No Egito, a nação mais inf luente da região, 18 dias de protestos foram suficientes para que, em 11 de fevereiro, o generalHosni Mubarak (presidente no poder havia 30 anos) também deixasse o território e o cargo. Os militares, que se recusaram a lutar contra os civis, assumiram o governo interinamente e ainda devem influenciar o processo de transição.

Na Líbia, os protestos estouraram no mesmo embalo. A população local clamava pela queda do ditador Muamar Kadafi, que mobilizou tropas militares para sufocar a ação dos rebeldes (até o fechamento desta edição, o país vivia uma guerra civil e era alvo de ataques aéreos internacionais).

O efeito dominó, que começou na Tunísia, alcançou Egito e Líbia e impulsionou a situação de tensão e os protestos em vários países do entorno (leia o mapa na página à direita), teve um componente especial. "Embaladas por um sentimento de igualdade, as pessoas pensavam: ‘Sefoi possível em Túnis e Cairo, por que não aqui?’", explica Marcelo de Souza, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Conhecer esses fatos é importante, mas insuficiente: os estudantes precisam saber como analisar o cenário criticamente (leia o projeto didático).

Encaminhe análises cartográficas sobre os três países de mais destaque. Use mapas políticos, econômicos, de recursos naturais e relacione-os a questões históricas. O petróleo, por exemplo, só passou a ter importância no cenário mundial com o advento da indústria moderna. Depois, ajude a turma a concluir que há várias similaridades entre essas nações e a vizinhança e que elas ajudaram para que a situação chegasse a esse ponto.

Economia A riqueza gerada com o petróleo não resulta em melhores condições de vida e distribuição de renda e o desemprego, em alta, impulsiona as taxas de imigração para a Europa.

Idioma A predominância do árabe facilita a troca de informação entre as populações e isso proporciona certa dose de reconhecimento entre os povos.

Educação O crescente acesso à universidade e informação fornecida pela internet levam a juventude a clamar por mais oportunidades de trabalho e maior liberdade política.

Passado colonial A região sofreu com o domínio do Império Otomano (entre 1453 e 1922), a colonização de franceses e ingleses após a Primeira Guerra Mundial e a influência norte-americana depois da Segunda Guerra Mundial.

Marcos Silva, docente da Universidade de São Paulo (USP), chama a atenção para a chance de esses levantes não serem genuinamente populares. Há a desconfiança de que eles podem ter sido orquestrados por grupos interessados em tomar o poder (mas ainda não é possível identificá-los). "No entanto, é inegável que as mobilizações têm um forte apoio das populações", ele enfatiza.

Mapa dos territórios em ebulição

Mapa da África e do Oriente Médio: países com levantes populares
Na vizinhança do epicentro dos levantes (países em laranja), as nações que têm motivos para viver dias conturbados (países em verde). Confira abaixo as características dos países e as reivindicações populares.

Tunísia
Idioma: árabe
População: 10,3 milhões
PIB: US$ 39,5 bilhões
IDH: 0,683
Economia: turismo, agricultura, mineração e produção de eletricidade
Regime político: república presidencialista
Religião: maioria islâmica

Líbia
Idioma: árabe
População: 6,5 milhões
PIB: US$ 58,7 bilhões
IDH: 0,755
Economia: petróleo
Regime político: ditadura militar
Religião: maioria islâmica

Egito
Idioma: árabe
População: 84,4 milhões
PIB: US$ 187,9 bilhões
IDH: 0,620
Economia: petróleo, turismo e o pedágio cobrado no Canal de Suez
Regime político: república presidencialista
Religião: maioria islâmica

Reivindicações (dos países em verde no mapa acima):

Mauritânia: Jovens pedem empregos, queda dos preços de produtos básicos e o fim da ditadura militar

Marrocos: Reformas democráticas e imposição de limites aos poderes do rei Mohammed VI

Argélia: fim das altas taxas de desemprego e da dificuldade para obter visto de saída do país

Jordânia: Empregos. Para conter as manifestações, o rei Abdullah II nomeou novo primeiro-ministro

Kuwait: Queda dos índices de desemprego, acesso à Educação e à saúde e a renúncia do primeiro-ministro

Arábia Saudita: Distribuição da riqueza gerada pelo petróleo. Há promessas de mais recursos para habitação

Bahrein: Reformas políticas e igualdade de direitos dos xiitas em relação à elite política do país, sunita

Omã: Mais democracia e a saída do sultão Said bin Taimur, que está no poder desde 1970

Iêmen: Fim da corrupção, do desemprego e da administração de 32 anos de Ali Abdullah Saleh

Djibuti: A saída do presidente Ismail Guelleh, cuja família está no poder há mais de 3 décadas

Conflitos no Egito fizeram a região ganhar destaque

Egito
Em vários pontos do país, o povo se organizaou para protestar contra o governo. Houve embates com a polícia,
mas os militares se recusaram a conter o movimento.

Por ter grande peso político e econômico, estar localizado estrategicamente e ser o país mais populoso das redondezas, o Egito é considerado uma potência local (leia o mapa acima). Por isso, especialistas avaliam que seu futuro pode inf luenciar o comportamento de outros povos que enfrentam cenários semelhantes recentemente.

Depois da queda de Mubarak, por exemplo, foi permitido que um navio de guerra iraniano atravessasse o Canal de Suez – algo impensável com Mubarak no poder. Simbolicamente, isso pode indicar que o país vai adotar posturas menos pró-Ocidente, como fazia até então. Entretanto, Souza, da UFRJ, aponta que também é possível que o Egito adote uma postura mais próxima da Turquia, onde há eleições e garantia de direitos civis e, ao mesmo tempo, a manutenção da influência política dos militares. Isso pode diminuir a tensão na região e minar novos conflitos.

Se Kadafi for derrotado, aumentam as possibilidades de o efeito dominó atingir outras nações com regimes autoritários, como a Jordânia, que enfrenta altos índices de desemprego, e a Síria, que vive sob uma ditadura militar desde 1970.

Ao tratar desses cenários futuros, explicite que eles não são meras especulações. Os estudiosos levam em conta as similaridades entre os países e as conjunturas. E é isso o que os alunos também têm de fazer ao estudar conf litos.


O que a turma pergunta

Os protestos têm como objetivo tornar os países em questão mais democráticos?
Não necessariamente. Explique aos estudantes não ser possível afirmar que essas populações clamem pela implementação da democracia nos moldes ocidentais. Segundo Marcelo de Soua, da UFRJ, outras formas de organização política, como um governo democrático, mas com participação significativa dos militares, atendem às demandas locais. É válido propor que os alunos ref litam sobre o fato de que viver em uma nação democrática nem sempre é, na prática, sinônimo de garantia de direitos civis, distribuição de renda e oferta de emprego – demandas dos levantes estudados.

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