30.9.11

Fidel Castro na estrada de Siboney

Fidel Castro, então líder revolucionário cubano, em janeiro de 1955, quase dois anos após a fracassada investida contra os quartéis de Moncada e .... Foto: Getty Images

Fidel Castro, então líder revolucionário cubano, em janeiro de 1955, quase dois anos após a fracassada investida contra os quartéis de Moncada e Céspedes
Foto: Getty Images

"Dentro de poucas horas vocês serão vitoriosos ou derrotados, mas, independentemente do resultado, este movimento triunfará. (...) Vocês já conhecem os objetivos de nosso plano; é um plano perigoso, e aqueles que me seguirem esta noite terão de fazê-lo voluntariamente."
Trecho do discurso de Fidel Castro aos seguidores na madrugada do dia 26 de julho de 1953

Santiago de Cuba, na Província do Oriente, é um lugar e tanto. Fica em um canto da ilha oposto à Havana, numa baia bem em frente ao Mar das Caraíbas, distando uns 250 quilômetros da Jamaica e de São Domingo e bem próxima do Haiti.

Do seu ancoradouro é que, em 1519, a pequena esquadra de Hernán Cortés fez as velas para ir conquistar o México. No mesmo lugar, quase quatro séculos depois, desembarcaram as tropas ianques durante a guerra hispano-americana de 1898 que pôs fim ao império espanhol na América.

No clima romântico daquelas paragens, entre as areias caribenhas e a serra da Gran Piedra, é que nasceu o bolero, levado ao mundo pela voz de Bola de Neve, um elegantíssimo cantor negro de Santiago que foi uma espécie de Nat King Cole cubano. Esse gênero musical, que Ernesto Lecuona imortalizou com "Siboney", sua mais famosa composição, nome de uma bela praia próxima a Santiago.

Pois foi ali, em um sítio não muito distante do mar - a granjita de Siboney -, que no dia 26 de julho de 1953 o então jovem advogado Fidel Castro, que encabeçava o movimento rebelde, arrebanhou sua gente para lançar-se numa façanha aparentemente impossível: derrubar a ditadura de Fulgêncio Batista.

No total, eram 148 pessoas. Entre eles, duas mulheres: Melba e Haydée Santamaria, e ainda dois comunistas - o restante era do Partido Ortodoxo Cubano, de moderada tendência nacionalista.

Fidel Castro os convencera a praticar um espetacular ato de repúdio à supressão da Constituição de 1940, que Batista substituíra, depois do golpe de 10 de março de 1952, por uma fornada de mais de 200 artigos do seu regulamento autocrático.

O estado bucaneiro
O ditador, de fato, lançara as bases de um estado bucaneiro, no modelo daqueles que existiam na região caribenha na época do auge da pirataria, nos séculos XVII e XVIII, voltado para a jogatina, para a exploração da prostituição e para o acolhimento do dinheiro sujo arrecadado em outras partes do mundo (especialmente os dólares vindos da máfia americana).

Pessoalmente, ele embolsava 30% dos cassinos do gângster Mayer Lansky, seu parceiro na rede hoteleira de Havana, enquanto que dona Marta, a benemérita primeira-dama da ditadura, conformava-se com 10% das casas de jogo de Santo Trafficante Jr. Além de desmoralizar o país, Batista corrompeu os oficiais dos quadros superiores das forças armadas, convidando-os a que assumissem o controle das boates e dos inferninhos dos principais pontos turísticos da ilha. Tornara-os rufiões!

No universo do domínio ianque, Cuba foi reservada para exercer um papel bem específico: a ilha era o paraíso da contravenção. Tudo o que um cidadão americano não podia consumir livremente nos seus estados ele conseguia por lá: jogo, sexo, bebida e drogas. Tudo à vontade e a preços risíveis, tendo ainda como brinde poder baforar um Cohiba, charuto de preço proibitivo em Nova Iorque.

Em busca de um 'território livre'
A escolha que os insurgentes fizeram, de atacar simultaneamente dois quartéis na Província do Oriente - o de "Moncada", em Santiago de Cuba, e o "Céspedes", em Bayamo -, devia-se a que, bem sucedida a operação, formariam ali um "território livre", separado do restante da ilha.

Bem posicionados, reforçados pelas armas capturadas, o exemplo deles inspiraria uma revolta geral contra Batista. Seria, pensavam eles, a fagulha que incendiaria a ilha por inteiro. A data escolhida, 26 de julho, combinava com o dia derradeiro do carnaval cubano, celebrado no Dia dos Reis.

Até um poeta levaram junto. Raul Gómez Garcia redigiu um trovejante "Manifesto de Moncada", que além de denunciar os "crimes de sangue, a desonra e luxúria desenfreada", conclamava os cubanos a lutar contra aquele regime de corsários.

Fidel Castro, à frente de um cortejo de carrões carregados com sua gente mal armada, imaginou surpreender os soldados pegos no torpor da ressaca. Deu tudo errado. Não conseguiram ocupar nenhum dos dois quartéis.

Nos dias seguintes, Batista ordenou uma operação de extermínio dos rebeldes, matando 69 deles. Fidel Castro, capturado vivo, salvou-se por um milagre de ter o mesmo destino.

Quem poderia imaginar naquela ocasião, no nascimento do Movimento 26 de Julho, há mais de 50 anos, que aquele Fidel também se tornaria um tirano da ilha que ele jurara algum dia libertar?

Fonte:

VOLTAIRE SCHILLING